Brasileiristas

A Democracia em tempos de polarização

Fonte: Politize! https://www.politize.com.br/o-que-e-polarizacao-politica/

"Como qualquer outro animal, o corpo do ser humano se modificou ao longo do tempo com um objetivo claro, apesar de inconsciente: adaptar-se às circunstâncias e ao ambiente para sobreviver o maior tempo possível. Uma das estratégias utilizadas era se juntar a outros indivíduos e formar grupos.

Para ser aceito em um grupo, era preciso se mostrar digno de confiança, o que por sua vez exigia lealdade. Ela era fundamental para que um agrupamento de indivíduos agisse de modo coordenado e organizado. A grande questão é que ela , quando levada a fundo, implica em abrir mão da própria individualidade para aceitar as normas, crenças e ideias do grupo.

Com isso, podemos dizer que nosso cérebro foi programado para encontrar uma turma, e se adaptar a ela. O grupo passa a fazer parte da identidade individual. Dessa forma, existe um prazer em ser fiel ao grupo, enquanto mudar de ideia e se opor ao grupo com o qual nos identificamos é altamente desconfortável.

Mas fazia sentido: naquela época, era uma questão de vida ou morte. A sobrevivência dependia de ser leal a um grupo e de tratar adversários como inimigos mortais. Hoje em dia, essa estratégia pode trazer consequências negativas.

A polarização política é um fenômeno complexo que tem suas raízes na própria natureza humana e na maneira como nos organizamos em sociedade. Aqui estão alguns pontos importantes para entender como começou:

  1. Origens biológicas: Como qualquer outro animal, o corpo do ser humano se modificou ao longo do tempo para se adaptar às circunstâncias e ao ambiente para sobreviver o maior tempo possível. Uma das estratégias utilizadas era se juntar a outros indivíduos e formar grupos. Para ser aceito em um grupo, era preciso se mostrar digno de confiança, o que por sua vez exigia lealdade.

  2. Identidade de grupo: O grupo passa a fazer parte da identidade individual. Dessa forma, existe um prazer em ser fiel ao grupo, enquanto mudar de ideia e se opor ao grupo com o qual nos identificamos é altamente desconfortável.

  3. Polarização e democracia: Ao longo dos séculos, a humanidade se organizou de formas complexas e criou sistemas para organizar o poder. Uma das inovações foi a democracia. Por meio da democracia, não seria necessário usar a força para chegar ao poder: a disputa não aconteceria por meio da violência, mas pela discussão de ideias e apresentação de propostas para melhorar a vida de todos.

  4. Polarização na política contemporânea: Quando o assunto era política, havia, até 2013, seis principais comunidades, divididas por suas preferências e prioridades. A partir das manifestações de junho daquele ano e das eleições presidenciais de 2014, essas comunidades se dividiram em apenas dois grupos mais afastados e polarizados: progressistas e conservadores.

  5. Polarização e identidades sociais: A começar pelo alinhamento dos eleitores negros com o partido democrata, a partir de 1960, uma série de outras identidades sociais, entre as quais o status conjugal e a religião, passaram, progressivamente, a definir o alinhamento dos eleitores com os partidos.

O caso da Alemanha a partir de 1989 (queda do muro e reunificação do pais) segudo Rudy Koopmans:

  1. Diante das dificuldades econômicas começaram os protestos populares, que inicialmente pediam por mais empregos.

  2. Em seguida o pleito dos manifestantes se modificou para: empregos da Alemanha para os alemães.

  3. Com o desenvolvimento do movimento, começaram a aparecer gestos neonazistas. O resultado foi um contra-movimento, pq na sociedade alemã do início dos anos 90 não havia qualquer espaço para isso (assim como acredito não haver até hoje).

Analisando a partir da fixação conceitual:

Legitimidade: quando o conteúdo da comunicação é bem aceito. Neste caso o debate não se estabelece porque todos concordam (alguém discorda da solicitação de mais empregos?)

Ressonância: ocorre quando há um certo nível de discordância sobre a mensagem. Nestes casos se estabelece o debate. No exemplo acima, quando os manifestantes pediram e que os empregos na Alemanha fossem dirigidos aos trabalhadores alemães, alguns perceberam a mensagem com um conteúdo de xenofobia, e o debate ressoou.

No terceiro momento dos movimentos sociais associados à reunificação, quando apareceram gestos neonazistas que ressonaram para a sociedade, ali não havia qualquer legitimidade (grande discordância sobre a mensagem) pq a sociedade em geral não tinha tolerância ao tema, os manifestantes perderam apoio e o movimento acabou.

Ou seja, o momento de maior repercussão social dos movimentos ocorreu quando havia uma mensagem que contava com uma certa quantidade de divergência.

Ressonância = Visibilidade = Extensão da cobertura dos meios de comunicação de massa (era assim).

As mídias tradicionais tendem a colocar em suas pautas os assuntos que geram maior ressonância. Havia uma certa intermediação dos principais atores políticos, econômicos e sociais com os barões da comunicação de massa, e isso permitia que alguns conteúdos não ressonassem, por uma avaliação de que seriam impróprios ("isso a Globo não mostra"). Mas com o advento das redes sociais, tudo mudou. A grande mídia perdeu espaço para as pequenas mídias, apesar de ainda terem o poder de ressonar determinados assuntos e serem percebidas como referência de credibilidade. A grande mídia, a mídia tradicional, deixou de ser fundamental em todos os casos onde se pretendia uma comunicação ampla, para hoje transitarem entre o recurso necessário e apenas o útil...

O filtro de conteúdo que as mídias tradicionais produziam foi interrompido pelas novas tecnologias no sentido prático, e hoje se tenta restabelecer pela regulação das redes ou decisões judiciais. para os novos atores poderão se transformar em um limite para gerar ressonância, em uma sociedade onde os valores fundamentais da sociedade foram destruídos em favor de personalidades.

Vide a popularidade do goleiro Bruno, da Suzanne von Richtoffen, e mais recentemente das piadas com o Tio Paulo...

Voltando ao tema: Afinal, a polarização oferece riscos à DEMOCRACIA?

-> pode sim trazer vários riscos para a democracia.

Ao longo dos séculos, a humanidade se organizou de formas complexas e criou sistemas para organizar o poder. Uma das inovações foi a democracia.

Por meio da democracia, não seria necessário usar a força para chegar ao poder: a disputa não aconteceria por meio da violência, mas pela discussão de ideias e apresentação de propostas para melhorar a vida de todos. Quem convencesse mais cidadãos e conseguisse mais votos chegaria aos postos de comando.

Não é à toa que a democracia vai muito além do voto. Como apontam Steven Levitsky e Daniel Ziblatt no best-seller “Como as democracias morrem”, ela requer respeito a regras comuns, reconhecimento da legitimidade dos adversários (ou seja, tratá-los como competidores legítimos dentro de uma disputa igualitária), tolerância e diálogo.

O excesso de polarização compromete todos esses quesitos. Em uma sociedade concentrada em dois lados radicalizados, adversários são vistos como inimigos, o diálogo não é incentivado – é até condenado – e transgredir as regras parece justificável.

Quem procura se manter fora desses dois grupos, apresentando outras visões e ideias, ou mesmo quem defende que ambos os lados têm suas falhas e virtudes, é tratado como “isentão”. As alternativas que fogem às duas apresentadas acabam sendo invalidadas.

(fonte: do site Politize)

Um indivíduo, ao se integrar a um dos eixos de polarização, está contribuindo para o enfraquecimento da própria democracia - mesmo que faça isso em nome da... defesa da democracia!! É importante observar que podem surgir grupos minoritários que vão exibir o mesmo comportamento polarizado, atuando também no enfraquecimento dos pilares que promovem a sustentação do regime democrático.

Aqui estão sumarizados alguns pontos importantes da polarização política:

  1. Fechamento ao diálogo: A polarização política pode levar a uma situação em que os grupos se fecham em suas convicções e não estão dispostos ao diálogo. Isso pode dificultar a busca por soluções consensuais para os problemas da sociedade.

  2. Visão de inimigos: Quando não existe congruência entre políticos de lados opostos, a democracia entra em risco. Os grupos passam a se enxergar como inimigos e deixam de aceitar o direito de existência de uma oposição ideológica.

  3. Risco de regimes autoritários: Em um cenário de polarização extrema, regimes autoritários podem ganhar força. Isso ocorre porque a polarização pode ser usada para justificar medidas antidemocráticas em nome da proteção contra um “inimigo” percebido.

  4. Desestabilização da democracia: Um ambiente político polarizado pode contribuir para desestabilizar uma democracia. Isso pode levar a crises políticas e sociais.

  5. Deslegitimação das oposições: Um dos efeitos observados diante da ascensão de líderes polarizadores envolve o interesse em gerar conflitos na sociedade para arregimentar militantes radicalizados e propensos a deslegitimar as oposições.

  6. Intolerância e violência: A polarização política pode levar ao extremismo, à violência e à intolerância. Isso pode criar um ambiente de hostilidade e conflito, prejudicando a convivência pacífica na sociedade.

Portanto, é essencial promover o diálogo, a tolerância e o respeito às diferenças para mitigar os riscos da polarização política à democracia.

É relevante pontuar que este processo não é uma exclusividade brasileira.

Mas o que mudou tanto? No passado os políticos produziam declarações consensuais - até quando mentiam. Hoje os políticos buscam fazer declarações para dividir opiniões e com isto conseguirem ressonância. "O país precisa de mais homens com testosterona!!!"

Por que uma mensagem como esta ressona na sociedade? Pq tem um grupo que efetivamente concorda com ela.

Nas eleições presidenciais americanas de 2016, Trump pautou a campanha inteira com declarações polêmicas, tipo: "América para os americanos", ou "Nosso país precisa de um muro na fronteira sul." Saiu de uma posição de improvável candidato republicano para a presidência do maior país do mundo. Venceu primeiro a disputa pela atenção da sociedade, e a partir dela ganhou os votos que precisava para se eleger.

Nota final do Host:

Lamento por constatar que a busca pela polarização passou a ser uma estratégia de comunicação política competitiva. Isto vai continuar até que os eleitores demandem de seus representantes opções de políticos que apontem para os consensos que podem levar a sociedade para uma situação de desenvolvimento econômico, em ambiente de paz social. O problema não é dos políticos, mas da sociedade, e correndo o risco de generalizações injustas em casos particulares, o problema está em cada um de nós.